segunda-feira, 25 de outubro de 2010
As tradições inventadas em Monlevade
Uma cidade que não tem tradições é tristemente desnivelada. É vista por baixo. É pobre. Nossa cidade é carente de tradições culturais que possam elevar-lhe o nome junto às demais. O que caracteriza o município? Catas Altas faz vinho, Ouro Preto tem o Barroco, Alvinópolis tem a chita e nós? Bem, fazemos aço, é verdade. E o fazemos, em maior escala, desde 1827, quando chegaram os equipamentos ingleses que turbinaram a fábrica modesta de Jean Antoine Félix Dissandes de Monlevade.
Mas o aço que produzimos ocupa (e muito bem) o segmento econômico. É interessante pensar que o mundo conhece o fio máquina fabricado aqui por trabalhadores, que são nossos pais, parentes e irmãos. Mas nós, monlevadenses, desconhecemos a força cultural desse material.
Uma cidade sem tradição vira as costas para o progresso. Seria esse o motivo de nossa estagnação cultural? Por que não abraçamos os aços longos da Usina e o transformamos em nossa bandeira? Por que não há uma discussão sobre a produção, um seminário nacional de siderurgia realizado no município? Por que não há um festival cultural do aço? Por que não há oficinas diversas sobre o assunto? A população sabe como é feito o aço desta terra e que ganhou o mundo?
Mas lembrando de Hobsbawm (1991), o que chamamos de tradição, aqui, sinceramente, não é nosso de fato. Não faz parte e nem corresponde às nossas raízes. Pense bem: Nosso maior evento cultural é uma cavalgada... isso, numa cidade que tem área mínima de zona rural. Por que gostamos tanto de encontro de motociclistas e desconhecemos nossos artistas plásticos?
Precisamos construir nossas tradições. Entender de onde surgiram nossas raízes para fazer disso a bandeira de nossa cidade. Enquanto desconhecermos essa identidade, essa memória cultural, continuaremos aplaudindo as invenções que se tornaram tradições em Monlevade.
* Hobsbawm, Eric. A invenção das tradições (1991).
sexta-feira, 15 de outubro de 2010
Nossa Memória Virtual
O advento da tecnologia digital é também um avanço para as questões ligadas ao memorialismo e à coleção de dados e informações, que, embora despretensiosamente, tornam-se importantes elementos de rememoração. Explico. Na era digital em que estamos inseridos, o desejo de reunir e gravar as informações que nos rodeiam é cada vez maior.
Hoje, qualquer aparelho de celular é provido de uma câmera digital, que está pronta para o registro de momentos especiais. Às vezes, por causa deste acesso facilitado a uma câmera, todo momento torna-se especial. Basta clicar e pronto.
Aliando isso às redes sociais, através da Internet, como Orkut, Twitter e blogs dos mais variados tipos, a memória faz-se cada vez mais presente. Isso, por causa da facilidade de compartilhar informações pessoais com o resto do planeta.
Muito em função da Pós-Modernidade, que nos atropela com sua velocidade e com a pulverização da materialidade, o indivíduo sente necessidade de manter-se vivo, de fazer-se presente neste mundo virtual que nos envolve.
Talvez por isso, explica-se o excesso de exposição da individualidade: a escrita de blogs, a postagem de mensagens estritamente pessoais via Twitter, o compartilhamento de imagens e fotografias no Orkut e no Facebook, além do registro de vídeos e a divulgação dos mesmos através do Youtube. É como se precisássemos de nos revelar, revelando nossas emoções e experiências.
A era digital chegou e por mais atual que ela seja, representa também e cada vez mais claro, um desejo de arquivar a vida por meio da exposição da individualidade. Nunca se viu tanto autorretrato como agora. Nunca se viu tanta escrita de si, tanta exposição pessoal, tantos registros de memória.
A pós-modernidade luta contra a falta de tempo e de espaço. Talvez por isso, bastam 140 caracteres para contar um fragmento da existência pessoal. A maioria das pessoas que utilizam esses recursos de coleção da memória está em busca da elaboração de um grande livro da vida, cujas páginas são redigidas por fragmentos no universo virtual das redes sociais.
sexta-feira, 8 de outubro de 2010
A escrita de nossa história
Desde a época das cavernas, o homem tenta se arquivar. As pinturas em pedras e cavernas representam a mais pura necessidade de registrar a história. Os animais reproduzidos em tinta vermelha e aquelas figuras parecidas com humanos compõem uma narrativa, para que, num futuro, alguém compreendesse aquela história.
Depois, com a invenção da imprensa, os homens começaram a registrar seus feitos em diários e a revelar-se por meios de longas correspondências. Muitas dessas informações depois, tornaram-se documentos preciosos.
Hoje, a escrita da história é uma das características da chamada era pós-moderna, na qual estamos inseridos. Oprimidos pela fragmentação, pelo excesso de informações e pela velocidade que assola nossos dias, agarramos cada vez mais às nossas memórias, transformadas em tabuas de salvação contra o esse mundo, em que a superficialidade, o instantâneo e as grandes verdades caíram por terra.
E, é exatamente na Pós- Modernidade, que as escritas das memórias pessoais ganham força. Sejam elas biográficas ou autobiográficas, textos do gênero ganham cada vez mais espaço nas prateleiras de livrarias e também nos jornais e revistas. O importante Folha de S.Paulo traz um obtuário interessantíssimo. Baseado na mesma fórmula do grande The New York Times e de alguns jornais londrinos, um repórter escreve, em poucas linhas, a biografia de algum falecido (famoso ou anônimo, não importa) em estilo literário, destacando detalhes da personalidade do indivíduo, tão interessantes, que o aproxima de um personagem de ficção. Eu adoro ler e recomendo. Inclusive, já até me arrisquei a escreve alguns.
A necessidade de redigir sobre nós mesmos, de deixar marcas na história é uma característica da coleção pessoal, exigida desde os tempos imemoriais. Os seres humanos têm carência de lembrança, precisam desse apego ao passado, desse encontro com o que foram um dia. Assim: a memória é nosso maior banquete. Deliciemo-nos.
terça-feira, 5 de outubro de 2010
Memorialismo pulsante na artéria
Já falei também neste espaço, que Francisco Barcelona e o professor Dadinho são os arcontes da cidade. São os guardiões dos arquivos e intérpretes deles. Já falei ainda, do jornal O Morro do Geo e do jornalista Marcelo Melo, um dos primeiros a resgatar esse passado tão vivo quanto presente de nossa cidade. Coramar Alves e Francisco Bernardino também colecionam causos e vivências sobre o passado de João Monlevade. Agora, descubro o trabalho do advogado Sebastião Eustáquio, que pela Internet, mantém um blog em que fala também da cidade antiga, chamando a atenção para locais históricos. Tudo muito interessante.
Outro dia comecei a refletir sobre uma questão: a Usina, por motivos de sua expansão, há cerca de 25 anos, precisou ocupar a Cidade Alta, em nome do progresso e do desenvolvimento. Será que, com as novas obras de duplicação da capacidade de produção, outras partes da cidade também não poderão ser extintas? Rua dos Contratados? Região do Social Clube? Antiga “vila dos engenheiros?” E se a mudanças do presente, com as novas obras, trouxerem novos impactos ao patrimônio municipal? Sim, eu sei: o progresso tem dessas coisas mesmo. Mas, será que a história vai se repetir?
Na verdade, a memória, em Monlevade, tem grandes particularidades. Uma delas, talvez seja, justamente, o desejo de que aquele tempo, vivido no Centro Industrial de antigamente voltasse de novo. Não sei o que isso significa ou o que representa. Lembro de Freud, num estudo em que revela que todo colecionador tem pulsão de morte. Grosso modo, o genial psicanalista afirma que quem coleciona algo, tem tanto medo de ser esquecido, que vai arquivando o presente e tudo o quanto pode salvar, enquanto a vida não lhe escape dos dedos. Talvez, por medo de um dia, a história tornar a se repetir, o monlevadense tem essa mesma pulsão, esse desejo de amar demais o passado e se esquecer de olhar para o presente e para o futuro. Vamos seguir em frente!
segunda-feira, 27 de setembro de 2010
Memórias XVIII - Esquecer para lembrar
Imerso nesta constante memorização, Funes não refletia, não selecionava as informações para que pudesse lembrar depois. O excesso de memória mata a reflexão. Não adianta iniciarmos uma longa e interminável rememoração de tudo o que se passou, sem algum critério mínimo de organização.
Não adianta, como a personagem do conto, nos transformarmos em um banco de informações e dados preciosos a respeito de nosso passado, sem no entanto, lançar sequer um olhar de crítica para ele. Hoje, vivemos num mundo tomado de informações: jornais, revistas, sites, blogs, redes sociais, entre outros elementos nos bombardeiam, a toda hora, com tantos dados.
No entanto, é preciso filtrar, reciclar, organizar e criticar para que a memória seja, então, valorizada de fato. Não adianta nos tornarmos enciclopédias repletas de saudosismo e nada mais. Até porque, o memorialismo não é feito somente de coisas aprazíveis. A memória, além da doce rememoração, pode também trazer o cheiro pobre do passado. Mas insistimos em esquecer desses percalços. Como ferramenta de felicidade, alimentamos uma falta daquilo que julgamos ter amado um dia.
Esquecimento e lembrança complementam-se. Precisam um do outro. Estão unidos numa interdependência fora do comum, pois um não vive sem o outro. Neste sentido, apesar do ridículo obvio, é preciso esquecer para lembrar. E se não nos esquecermos, como podemos fazer uma seleção daquilo que, de fato, merece figurar nas listas de reminiscências? Como valorizar os detalhes importantes de nossa história, se insitimos em lembrar sempre das mesmas coisas? Sim. A memória daquilo que está sempre sendo lembrado, torna-se banalizada. Esqueçamos. Para então lembramos depois.
quarta-feira, 22 de setembro de 2010
Memórias XVII - Livro de receitas
A partir desse exemplo primário, percebe-se a dimensão que os registros históricos têm em nossa vida. É preciso respeitar essas questões, pois elas contribuem para a composição de toda uma memória e também de uma história. Ressalta-se a importância da preservação dos documentos (no caso, o livro de receitas). Mas também, é preciso revisá-los, mergulhar a fundo nos saberes ali descritos, tentando compreender o que de fato eles representam. O pensador francês, * Michel Foucault afirmou certa vez, que a história mudou sua posição acerca do documento: ela considera como sua tarefa primordial, não interpretá-lo, não determinar se diz verdade nem qual é seu valor expressivo, mas sim trabalhá-lo no interior e elaborá-lo (...).
Resumindo, a grosso modo, o que disse o filósofo, o documento (o livro de receitas) não pode ser imaculado, algo intocável. Pelo contrário, deve ser, inclusive, questionado, incrementado, mexido e testado. Assim, nossa memória precisa ser reorganizada de forma crítica. Não se pode enaltecer tudo o que foi registrado, sem estabelecer m ponto de vista crítico.
Em vez de bater palmas para o que ficou do passado (e só porque ficou) é mais interessante, entender os rastros e as marcas deixadas por esse objeto ao longo dos anos. A sua constituição, a sua importância e as razões que o tornaram tão célebres. Vejamos. Depois de admirar o livro de receitas da avó, é preciso ver se os ensinamentos levam, realmente, a pratos saborosos.
Há muitos documentos intocáveis e que são elevados à categoria de obras (ou feitos) fundamentais. Mas, talvez, ninguém “ousou” saber qual de fato é a sua razão de ser. Nesse sentido, a revisão de nossa memória deve ser feita constantemente. Elogiar e reconhecer a importância dos documentos é fundamental para nossa condição de memorialistas. No entanto, é necessário rever essas fontes, desconfiando das coisas antigas e não apenas aplaudindo, sem interpretar e sem dar ouvidos ao contraditório.
* FOUCAULT, Michel. A Arqueologia do Saber. Rio de Janeiro : Forense-Universitária, 1987.
terça-feira, 14 de setembro de 2010
Memória XVI Flashes
Assim, caminhando pela avenida no fim de tarde, sentindo calor por causa da falta de chuva nesta época do ano, ele pensa nas contas a pagar. Pensa na fatura do cartão de crédito e fala de si para si: “Preciso diminuir esses gastos”. Está concentrando, os passos seguem rápido porque já são dez para as seis e é preciso chegar à lotérica antes que ela feche.
Mas aí, eis que de repente, uma brisa desatenta o pega de surpresa, com um perfume que ele não sentia há tempos. Em frações de segundos ele vasculha os arquivos cerebrais e descobre numa prateleira empoeirada, a lembrança de Maria, a primeira namoradinha.
Eram jovens demais. Ele tinha 14, talvez 15 anos. Ela não muito mais que isso. Mas o perfume que ela usava era aquele, como era mesmo o nome? Nesse instante veloz, nesse assalto repentino de memória, ele diminui o ritmo dos passos e se esquece da conta a pagar. Em seus olhos está Maria, seus cabelos pretos, compridos e molhados, penteados com as pontas dos dedos... Por onde anda hoje? Terá casado? Terá morrido? Faz anos... Mas o perfume, inconfundível, era o mesmo. Esse perfume que ele tanto adorava e que estava adormecido em algum lugar ermo da lembrança voltou a
E a saudade doeu, mas trouxe uma pontinha de prazer nessa recordação: ele e Maria, há tanto tempo, brincando de se amar: e era por toda a vida! Tudo era intenso, a vida era bebida depressa e com a sede dos que amam tão jovens... Maria se foi e ele também nem se lembrava de que fora um rapaz apaixonado um dia.
Bastou o perfume para lembrar. Aquele cheiro adocicado que inundou sua vida, naquele fim de tarde em que a chuva insistia em não chegar e o calor e o tempo seco deixavam tudo mais difícil. O perfume que veio com a brisa, inundou sua alma de memória. E ele agora estava inebriado de nostalgia, do tempo bom em que era rapaz e não tinha com o que se preocupar, a não ser, amar Maria e seus cabelos molhados. Ele riu ao deliciar-se de novo com o amor antigo, o amor infante e seguiu até a lotérica, mas agora, a passos mais lentos.
Memória XV - Como amendoins
Seu Zé é muito importante para mim. Aliás, ele mora em mim e ocupa lugar privilegiado em minha memória. Nunca esqueci do gosto do seu amendoim, torradinho, que comia durante os jogos de futebol no campo do Vigilante no Santa Cruz. Nunca mais comi um amendoim como aquele. E duvido que alguém saiba fazer um igual. Nem os maiores mestres da culinária...Não adianta insistir: como aqueles, nunca mais. Isso, porque o sabor que a boca da infância provou, não poderá ser sentido de novo. Coisas proustianas...
Seu Zé do Amendoim está presente e vivo em minhas lembranças de menino para sempre. Com suas mãos negras, ele me afagava a cabeça e me presenteava com um saquinho mágico de amendoins. A lembrança do Seu Zé e de seus amendoins permanece comigo, aonde quer eu vá.
Nos tempos do mestrado em São João del Rei, conheci também, um outro vendedor de amendoins. Ele andava (e ainda deve andar) pelos bares são-joanenses, vendendo a guloseima. Fazia um tipo: cachecol, boina e paletó e uma bolsa com amendoins. Parecia a figura de um avô de 80 anos. Pedia licença, sentava-se à mesa, contava um causo. “Juscelino tomou café aqui, se não me engano, sentado mais ou menos onde você está. Tancredo só gostava de tomar café no balcão”, dizia, para contar que aquele bar já foi um restaurante no passado em que políticos famosos costumavam reunir-se. E ia revelando suas memórias da cidade histórica, falava da vida do lugar e ia nos envolvendo com sua prosa, até a gente comprar uns dois ou três pacotes de amendoins... Eram gostosos, mas nunca como os de seu Zé. O legitimo torradinho que nunca mais comi depois que cresci.
Cada cidade tem os seus personagens célebres e que compõem, mesmo sem querer, a vida das pessoas. São aqueles verdureiros, os garçons, os entregadores de leite, os donos de padaria, as personalidades que ficam vivas para sempre na memória. O vendedor de amendoim de São João é desse tipo. Mas não é como seu Zé, do Vigilante, no Santa Cruz, que está impregnado em mim, vivo, na saudade de seus torradinhos com os quais deliciava-me na infância. A memória é como esses amendoins.
segunda-feira, 30 de agosto de 2010
Memorialismo e política
É senso comum dizer que o povo brasileiro não tem memória política. Por isso, talvez, sejam sempre reeleitos políticos maculados pela corrupção e pelos esquemas sórdidos de beneficiamento próprio. E isso está ligado à falta de um memorialismo revisitado e comprometido com as questões de nosso tempo.
Ao aproximarmos das eleições para as esferas estadual e federal uma pergunta não quer calar: Você se lembra em quem votou para deputado estadual e federal, senador, governador e presidente nas eleições de 2006?
Essa pergunta é séria e pertinente e tem a ver com o nosso fraco e desinteressado olhar para questões políticas e públicas, envolvendo, sobretudo, o legislativo estadual e federal. Enquanto nossa memória não for exercitada, ou seja, enquanto esquecermos em quem votamos, deixando de acompanhar a atuação deste político, projetos votados e propostas de leis, entre outras, vamos continuar omissos e repetindo as lamúrias de que os políticos não fazem nada. E isso, não é bem assim. Vale a pena acompanhar as ações através de sites da Assembléia Legislativa, do Senado e da Câmara dos Deputados.
Eu tenho um amigo que, outro dia, me mostrou todos os comprovantes de votação desde a primeira vez em que ele foi à urnas, em 1989. E o mais interessante, ouvir as explicações dele sobre as razões que o levaram a escolher esse ou aquele político. Além disso, ele falou que tem o hábito de olhar, pelo menos uma vez ao mês, o que o seu político anda fazendo, através dos sites e noticiários. Exemplo a ser seguido.
Ações simples como essa, nos tornam mais preparados para exercemos a cidadania consciente. A memória nos ajuda a sermos seletivos e preparados para manifestar os nosso apoio e nossa opinião a respeito de um candidato que mais tarde se tornará um político com voz ativa em questões importantes de nosso Estado. A escolha democrática de um político é fundamental. Mas também pode ser muito perigosa, quando feita sem responsabilidades e sem compromisso. Uma pesquisa mínima sobre o passado de candidatos novos e velhos da política seria o primeiro passo para votar de forma consciente. Pensemos nisso.
terça-feira, 24 de agosto de 2010
Algumas questões sobre o memorialismo
Como disse em outros textos, fala-se muito em memória, mas não há meios suficientes para legitimá-la, para edificá-la e transformá-la em algo concreto e justificado com a força de suas entranhas.
Vejamos. O lactário, as casas de madeira, a escadaria, os boieiros, os shows da rádio cultura, a praça central, as barbearias, os bares, as vivências os apitos da Usina e todo o resto daquela época, compõem uma saudade, representam uma lacuna que ainda vaga pelas trilhas da lembrança, que ainda grita, agita e se agiganta em ecos. Mas, para quem ouvir? E quando as vozes se calarem?
Também já escrevi aqui que é preciso reunir, catalogar, registrar, e transformar essas informações em ações para consultas e efetivá-las em referência da nossa identidade. Tomemos o exemplo do Centro de Cultura e Memória da ArcelorMittal. O hotel Cassino foi transformado e otimizado como museu que guarda o acervo de tudo o que diz respeito à unidade local da gigante mundial do aço. Ali estão reunidos documentos históricos, recortes de jornais, boletins informativos, fotografias, livros, registros de atas, entre outras pegadas que contam a história da empresa no município ao longo de 75 anos.
Por que não pensar em um centro de cultura e memória municipal? Um museu da imagem e do som? Onde pudessem ser registradas narrativas de nossa cidade, onde pudessem estar reunidas, fotografias, recortes, textos, objetos e demais objetos que possam contar a nossa história? Podemos avançar para o futuro quando conhecemos bem o nosso passado, que ainda respira forte e com bastante freqüência, na alma de João Monlevade.
sexta-feira, 13 de agosto de 2010
Memória XII – Os pioneiros
Além das dificuldades da travessia, imagino os desafios vividos por Jean de Monlevade nos primeiros tempos no Brasil: Diferenças de clima? De cultura, costumes? De linguagem? Nada disso foi entrave para ele, que vislumbrou o futuro edificando uma fábrica no quintal do seu Solar que se tornou referência para toda Minas Gerais.
Ok. Essa história não é segredo para ninguém, mesmo não sendo tão difundida em nosso município. O que chama a atenção é o que aproxima Jean Felix Dissandes de Monlevade com outro estrangeiro, o luxemburguês Louis Jaques Ensch. Ele chegou aqui quando a cidade estava engatinhando e veio com a missão de fechar a usina, pois essa não correspondia às expectativas. No entanto, o engenheiro vislumbrou possibilidades e arriscou na tentativa de reerguer a fábrica, saldando dividas e iniciando uma produção de qualidade.
Além disso, sob a batuta do maestro Ensch, começou a verdadeira transformação local, com a construção das vilas operárias, do centro velho, do Hospital Margarida, do lactário e de tudo o que deu origem ao que a cidade representa hoje.
Os dois pioneiros, Jean “Ensch” e Louis “Monlevade”, são pioneiros de tudo nesta cidade e suas memórias devem ser perpetuadas. Eles estão sepultados no Cemitério dos Escravos, que fica em frente ao Social Clube. Tamanho era o desejo de permanecerem aqui foi que ambos preferiram ser enterrados na terra que edificaram.
É preciso olhar para esses homens, para essas vivências. Homenageá-los, estuda-los. Preservar suas biografias. Até mesmo, para que sirvam de exemplo para que outros inovadores possam surgir e também fazer história. O momento é agora. Estamos diante de um processo de crescimento, com o aumento da capacidade de produção da Usina (a mesma que deu origem a tudo) e o caminho está aberto para novas conquistas. Só não sabe quem não quer.
Memória XI - Os arcontes
Um dos maiores nomes da filosofia contemporânea, o argelino Jacques Derrida, em seu livro “Mal de Arquivo”, teoriza sobre a função dos guardiões da memória. Segundo o pensador, esses, que são chamados arcontes não eram responsáveis apenas pela segurança física do depósito e do suporte. Cabiam-lhes também o direito e a competência hermenêuticas. Tinham o poder de interpretar os arquivos. Depositados sob a guarda desses arcontes, estes documentos diziam, de fato, a lei: eles evocavam a lei e convocavam a lei. Para serem assim guardados, na jurisdição desse dizer a lei eram necessários ao mesmo tempo um guardião e uma localização. Mesmo em sua guarda ou em sua tradição hermenêutica, os arquivos não podiam prescindir de suporte nem de residência.[1]
Em Monlevade também há pessoas que se preocupam em guardar os documentos de memória em suas residências, como se guardassem um tesouro, além de interpreta-los. Cito dois, cujos trabalhos conheço de perto: O escritor e professor Geraldo Eustáquio Ferreira, (Dadinho) e o escritor e fotógrafo Francisco de Paula Santos (Barcelona). Tanto um quanto o outro possuem invejável acervo que compõe um panorama da história da nossa cidade.
Dadinho escreve memórias e possui diversos registros históricos, fotos, diários e livros. Além de possuí-los, sabe também (e tão bem) interpreta-los pelo valor que possuem. Isso o torna um detentor do conhecimento, um arconte legítimo de nossa memória local. Francisco é fotografo e possui, além das imagens de uma Monlevade que passou, também tem em sua propriedade, um vasto arquivo, composto, sobretudo, por exemplares de jornais, revistas, livros e demais impressos publicados na cidade ao longo de trinta anos pelo menos.
Essa análise, a “grossíssimo modo”, vem em forma da divulgação do trabalho voluntário desses homens, que pesquisam, registram, arquivam, protegem e interpretam a memória. Imagino Monlevade no futuro, com um centro de memória em pleno funcionamento, onde se poderá consultar as informações do passado. Passado que hoje é presente, diga-se de passagem. O acervo desse centro está sendo construído desde já.
Os guardiões da memória são tão importantes e necessários quanto os próprios registros. Com eles, os arquivos estão resguardados. E, por serem os responsáveis por esse material, eles têm o poder de avaliá-los, julgá-los, classifica-los. O parecer do arconte sobre a história e a memória torna-se fonte de conhecimento para o futuro.
[1] DERRIDA, Jacques. Mal de arquivo. Uma impressão freudiana. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2001.p.7.
Memória X – Nosso patrimônio imaterial
Imagine se nossos saberes forem esquecidos? Os costumes de nossa gente, o modo como vivemos nossas histórias? Imagine se nunca mais lembrarmos daquela cantiga que nossa mãe, avós e tias sempre cantaram? Agora, imagine se começarmos a esquecer de nossas raízes. Lembre-se que raiz tem dois significados básicos: um, é o de sustento, aquilo que dá vida, equilíbio. O outro é o de origem, de nascimento, de surgimento. Os dois termos se complementam de alguma forma. Por isso, não podemos deixar que morram os costumes e tradições monlevadenses, patrimônios imateriais de nosso povo.
Essa riqueza não pode ser tocada, guardada num cofre, ou armazenada em potes de barro ou de ouro. Mas, nem por isso, deixa de ser uma preciosidade, digna de admiração e respeito. Essas belezas já estão incorporadas à cultura local e, talvez por isso, não sejam tão facilmente reconhecidas. Por exemplo, as canções do Congado, das Guardas de Marujo, as festas de Reis, a folia da Vaca Mineira, as festas religiosas de São Sebastião, Santa Rita e São José Operário, a coração de Maria em maio, as cantigas centenárias da Família Alcântara são algumas das riquezas culturais de João Monlevade.
Além disso, não se pode esquecer das histórias da cidade, como os da antiga Usina, por exemplo. Meu pai faleceu há um ano e dois meses. Com ele, morreram uma série de lembranças da antiga “Companhia”, como ele se referia à gigante ArcelorMittal. Perdi a chance de gravá-lo narrando sua forma de trabalhar como maçariqueiro nos idos de 1940, quando aos 15 anos de idade foi fichado como auxiliar de solda.
Ele tinha na memória, fatos da época. Sabia o nome e a função dos companheiros antigos, sabia como era a disposição da Usina, a localização exata dos escritórios, bem como o nome dos encarregados e pequenas histórias sobre eles. Morreu meu pai, morreram essas lembranças que não foram registradas.
Para que outras memórias não desapareçam, é necessário valorizá-las como patrimônio imaterial. Aquele que não pode ser tocado, guardado em caixas ou dependurado na parede. São vivencias e experiências de uma época, de uma vida que devem ser compartilhadas com a geração que virá. Somos assim: homens de memória e precisamos delas para sobreviver.
terça-feira, 27 de julho de 2010
A alma encantadora das ruas
Tomo o título emprestado do grande cronista João do Rio, cujo livro homônimo a esta, revela histórias das ruas do Rio de Janeiro do século XIX. Assim, acredito que poderia haver algo semelhante por aqui. As ruas de Monlevade precisam ter suas memórias registradas, através de um livro, cartilha ou revista. Afinal, quem são as pessoas que nomeiam logradouros por onde passamos todos os dias? Qual é a história dessas pessoas que entraram para a história municipal como personagens célebres?
Isso não se trata nem de uma questão para o futuro, mas mesmo para o presente. Será que a maioria da população sabe quem foi Gomes Batista, Ricardo Leite, Geraldo Soares de Sá, Geraldo Miranda, Lucindo Caldeira, entre outros? E o que eles fizeram para nomear as ruas da cidade? Desculpe a ignorância, mas eu não sei.
Por favor, amigos, familiares ou pessoas mais informadas do que este colunista, não me entendam mal. Não se trata, aqui, de discutir os méritos desses, mas de prestar um serviço importante para a preservação da memória da cidade, incluindo, a divulgação da biografia deles junto à comunidade.
Isso, também evita, que ocorra a triste mudança de nomes, tão comuns em tempos de desvalorização da memória. Afinal, não faz o menor sentido uma rua ter seu nome trocado por outro, depois de anos sendo chamada assim. É interessante pensar a respeito. Imagine você, se a avenida Wilson Alvarenga trocasse de nome? Como ficariam as referências? Falando nisso, será que todo mundo sabe quem foi Wilson Alvarenga? Será que a geração mais nova sabe que ele nasceu em Barão de Cocais e foi o primeiro prefeito de João Monlevade, pouco depois da emancipação?
O amigo e professor Dadinho elaborou, na revista sobre os 30 anos do bairro República, um dossiê intitulado: “Conheça o Patrono de Sua Rua”, interessante registro sobre quem foram os presidentes, seus feitos e curiosidades dos homens que nomeiam as ruas do bairro. Vale a pena conhecer.
Não se deve esquecer quem foram os heróis de nossa história. É por essas e outras, que é importante que se faça o registro desses nomes, sua trajetória como homens, suas ações e projetos para que esses não se percam com o inevitável passar do tempo.
segunda-feira, 19 de julho de 2010
DECLARAÇÃO DE VOTO
Voto em quem se dispõe a revolucionar a saúde e a educação. É uma vergonha o sucateamento do SUS e do ensino público. De 190 milhões de brasileiros, apenas 30 milhões se agarram esperançosamente na boia de salvação dos planos privados de saúde. Os demais são tratados como cidadãos de segunda classe, abnegados penitentes de filas hospitalares, obrigados a adquirir remédios onerados por uma carga tributária de 39% em média.Segundo o MEC, há 4,1 milhões de brasileiros, entre 4 e 17 anos, fora da escola. Portanto, virtualmente dentro do crime. Nossos professores são mal remunerados, a inclusão digital dos alunos é um penoso caminho a ser percorrido, o turno curricular de 4 horas diárias é o verniz que encobre a nação de semianalfabetos.Voto no candidato disposto ao controle rigoroso de emissão de gás carbônico das indústrias, dos pastos e das áreas de preservação ambiental, como a Amazônia. Não se pode permitir que o agronegócio derrube a floresta, contamine os rios e utilize mão de obra desprotegida da legislação trabalhista ou em regime de escravidão.
Voto em quem se comprometer a superar o caráter compensatório do Bolsa-Família e resgatar o emancipatório do Fome Zero, abrindo a porta de saída para as famílias que sobrevivem à custa do governo, de modo que possam gerar a própria renda.Voto no candidato disposto a mudar a atual política econômica que, em 2008, canalizou R$ 282 bilhões para amortizar dívidas interna e externa e apenas R$ 44,5 bilhões para a saúde. Em termos percentuais, foram 30% do orçamento destinados ao mercado financeiro e apenas 5% para a saúde, 3% à educação, 12% a toda a área social.
Voto no candidato contrário à autonomia do Banco Central, pois a economia não é uma instância divorciada da política e do social. Voto pela redução dos juros, a desoneração da cesta básica e dos medicamentos, o aumento real do salário mínimo, a redução da jornada semanal de trabalho para 40 horas.
Voto na legalização e preservação das áreas indígenas, de quilombolas e ribeirinhos, no diálogo permanente com os movimentos sociais e repudio qualquer tentativa de criminalizá-los, nas iniciativas de economia solidária e comércio justo, na definição constitucional do limite máximo de propriedade rural.
Voto no candidato convicto de que urge reduzir as tarifas de energia destinada ao consumo familiar e de uso de telefonia móvel. Disposto a valorizar fontes alternativas de energia, como a solar, a eólica, a dos mares e lixões etc. E que seja contrário à construção de termoelétricas e hidrelétricas nocivas ao meio ambiente.Voto no candidato que priorize o transporte coletivo de qualidade, com preços acessíveis subsidiados; exija a identificação visível dos alimentos transgênicos oferecidos ao consumidor; impeça a participação e uso de crianças em peças publicitárias; e condene veementemente o trabalho infantil.
Voto no candidato decidido a instalar a Comissão da Verdade, de modo a abrir os arquivos das Forças Armadas concernentes ao período ditatorial e apurar os crimes cometidos em nome do Estado, bem como o paradeiro dos desaparecidos.
Voto em quem dê continuidade à atual política externa, de fortalecimento da soberania e independência do Brasil, diversificação de suas relações comerciais, apoio a todas as formas de integração latino-americana e caribenha sem a presença dos EUA; direito de o nosso país ter assento no Conselho de Segurança da ONU; de repúdio ao criminoso bloqueio dos EUA a Cuba e à instalação de bases militares estadunidenses na América Latina.
Voto, sobretudo, em quem apresentar um programa convincente de redução significativa da maior chaga do Brasil: a desigualdade social. Este o meu voto. Resta achar o candidato.
(Frei Betto, semana de 18 a 24/04/2010, vários jornais do Brasil)
Memória VIII – A Memória como cultura
A memória é um dos elementos culturais mais importantes de um povo. Saber preservar sua origem, conhecer sua história e transmiti-la a gerações futuras são elementos estruturais para o desenvolvimento e para a soberania. Enquanto patrimônio cultural, a memória reforça as bases do pensamento coletivo e torna-se referência para a comunidade local.
Em João Monlevade, a memória deve ser encarada sob esse viés: é um dos muitos aspectos que compõem a cultura municipal. Tanto que há, na cidade, um memorialismo, inclusive, bastante recente. Acontecimentos de apenas 20,25 anos atrás são vistos como elementos importantes da cidade. Exemplo? As fanfarras das escolas que abrilhantavam o Desfile de 7 de Setembro nas décadas de 70 e 80.
Por muito tempo, ficou um lacuna neste sentido, com a extinção das fanfarras da Escola Estadual Dr. Geraldo Parreiras, da Escola Estadual Louis Prisco de Braga e Escola Municipal Israel Pinheiro (Emip), entre outras. Muita gente sentiu o fim dessa atividade cultural e lamentava o vazio que ficava na avenida, quando as referidas escolas passavam. Saudosos dessa lacuna, professores empenharam-se para reerguer as fanfarras e, salvo engano, esse ano a Geraldo Parreiras deve desfilar na avenida com a sua.
Outro exemplo de que a memória é um aspecto importante da cultura local é a luta pela manutenção e ressurreição do Floresta Clube Henry Meyers (antigo Clube de Caça e Pesca). O referido clube quase foi extinto, coberto de dívidas e com sérios problemas estruturais, entre outros. Mas, em nome da lembrança do que ele foi um dia e pela representação que ele ocupa na memória do povo monlevadense, meio que através de um milagre, a chama da esperança de manter o Floresta Clube de pé nunca se apagou. Bingos, campanhas promocionais, atividades para recuperar associados, reformas nas casas da lagoa, feijoadas às quintas-feiras, entre outras ações trouxeram alento ao Clube que ainda resiste. No entanto, o que nunca o deixou cair, efetivamente, foi a saudade do passado ali vivido. E, em função disso, a vontade de não deixar que o espaço se acabe.
A memória do monlevadense é uma poderosa força e deve ser preservada, respeitada e trabalhada nas escolas. É preciso reconhecer que, sem ela, a cidade seria muito diferente do que é hoje. Não cabe julgar se estaria melhor ou pior. Mas, sem esse importante elemento cultural, certamente, João Monlevade não seria a mesma.
Memória VII – Circuito Histórico
O Circuito Histórico, elaborado e mantido pela ArcellorMital Monlevade é uma das principais referências à passagem de Jean Antoine Felix Dissandes de Monlevade nestas terras. E, é também, uma homenagem feita pela empresa ao empenho e empreendedorismo do pioneiro francês que chegou ao Brasil em 1817.
Compõem o roteiro: o Solar Monlevade, o Museu do Ferro e Aço, o Cemitério dos escravos e o Hotel Cassino. Cada um desses locais possui uma importância histórica e significativa para a memória monlevadense. O Solar dispensa apresentações. É a primeira construção do município, que serviu de moradia para Jean Félix Dissandes de Monlevade e sua família. O museu, que fica ao lado do Solar, abriga a replica da Forja Catalã, usada pelo francês para fundição do ferro, demais ferramentas e utensílios utilizados na fábrica que é o berço do progresso da região.
O Cemitério dos escravos que também abriga os restos mortais de Monlevade, de sua esposa Clara Coutinho, do engenheiro Louis Ensch, entre outros, é uma das principais características da visão progressista de Jean de Monlevade: numa época em que escravos eram atirados em valas rasas, ele constrói um cemitério para os seus. Inclusive, sendo enterrado junto deles. Por fim, o Hotel Cassino, que abrigou hóspedes e engenheiros ilustres que vieram trabalhar na implantação da Usina e hoje foi transformado em Centro de Cultura e Memória da Arcellor.
Fora o Hotel, construído nos anos 30, os outros elementos fazem uma referência ao passado centenário da cidade. Talvez sejam as únicas marcas para legitimar que essas terras possuem quase duzentos anos e são um marco na história da siderurgia nacional. Cada um deles tem uma trajetória importante e, portanto, são patrimônios municipais que devem ser respeitados como tal.
Em 2005, durante as comemorações dos 70 anos da Usina de Monlevade, a Arcellor, através de seu gerente geral da época, Gerson Menezes, decidiu investir nesse olhar memorialístico, como num mergulho de volta ás origens para chegar ao progresso. Isso porque a memória ilumina novos caminhos e, de fato, contribui para se entender o passado, para aceitar o presente e receber o futuro. Com a duplicação da capacidade de produção que se inicia, faz-se ainda mais necessário analisar essas referências no contexto do desenvolvimento: somos ou não somos uma cidade que foi projetada para o desenvolvimento? Reflitamos.
Memória VI – Projeto Memória
O Projeto Memória, realizado durante alguns anos em Monlevade, sob gerência da Agência do Desenvolvimento de João Monlevade (Ademon) e financiado pela ArcelorMitall foi um passo importante para a preservação da memória do município. A proposta do projeto é arquivar fotos antigas, jornais e demais publicações do passado, além de produzir e também preservar vídeos com depoimentos de pessoas da comunidade que têm alguma história para contar sobre a cidade antiga. No entanto, não tenho noticias de sua continuidade.
O acervo constituído até então, salvo engano, está guardado nas dependências do Centro de Cultura e Memória da ArcellorMittal. Pelo que sei, o projeto memória reuniu muitas entrevistas e centenas de fotos. Essa proposta é uma das mais importantes para o registro do passado de Monlevade e que deveria estar disponível ao publico, como num Museu da Imagem e do Som.
Conhecer as experiências pessoais de perto é uma das formas mais interessantes de se resgatar e preservar a memória. Os relatos são, em si, uma forma de contribuição para o futuro, acerca do que foi o passado. E, Monlevade, tem isso de sobra. A força das autobiografias promove a projeção das memórias pessoais para o estabelecimento de uma memória coletiva. Isso, porque a narrativa pessoal de uma pessoa (por exemplo) projeta novas experiências, por meio da troca de informações memorialisticas
Como bem ressaltou o pensador francês Maurice Halbwachs, toda memória individual é também uma memória coletiva. Neste sentido, a recuperação de relatos de moradores antigos de Monlevade contribui para a formação de uma grande memória da cidade, unindo relatos e possibilitando assim, a criação de documentos históricos e de referências para a concepção de um projeto identitário para o município.
Nossa história recente está relacionada a esse passado que ainda não passou. É importante entender que João Monlevade tem um saudosismo presente e que este ainda é referencia para muitos de seus cidadãos. Ajudar a preservar esse material rico em historia, em personagens que ajudaram a construir essa cidade é um dever de todos. Seria muito penoso também deixar isso se perder.
segunda-feira, 5 de julho de 2010
Memória VI – Projeto Memória
O acervo constituído até então, salvo engano, está guardado nas dependências do Centro de Cultura e Memória da ArcellorMittal. Pelo que sei, o projeto memória reuniu muitas entrevistas e centenas de fotos. Essa proposta é uma das mais importantes para o registro do passado de Monlevade e que deveria estar disponível ao publico, como num Museu da Imagem e do Som.
Conhecer as experiências pessoais de perto é uma das formas mais interessantes de se resgatar e preservar a memória. Os relatos são, em si, uma forma de contribuição para o futuro, acerca do que foi o passado. E, Monlevade, tem isso de sobra. A força das autobiografias promove a projeção das memórias pessoais para o estabelecimento de uma memória coletiva. Isso, porque a narrativa pessoal de uma pessoa (por exemplo) projeta novas experiências, por meio da troca de informações memorialisticas
Como bem ressaltou o pensador francês Maurice Halbwachs, toda memória individual é também uma memória coletiva. Neste sentido, a recuperação de relatos de moradores antigos de Monlevade contribui para a formação de uma grande memória da cidade, unindo relatos e possibilitando assim, a criação de documentos históricos e de referências para a concepção de um projeto identitário para o município.
Nossa história recente está relacionada a esse passado que ainda não passou. É importante entender que João Monlevade tem um saudosismo presente e que este ainda é referencia para muitos de seus cidadãos. Ajudar a preservar esse material rico em historia, em personagens que ajudaram a construir essa cidade é um dever de todos. Seria muito penoso também deixar isso se perder.
sexta-feira, 25 de junho de 2010
Memória V - Para preservar os arquivos
O jovem monlevadense não viveu na Cidade Alta. Não preciso repetir. Além das fotografias antigas, das histórias contadas por pais e avós, nunca existiu vida além do muro do morro do Geo para os mais jovens. Eles não conheceram a cidade que acabou e, por isso, não podem sentir falta dela.
Assim, como não têm a vivência, como não andaram na rua Tamoios e nem na rua Tabajara; como não frequentaram os bailes do Grêmio, nem do União Operária; como não paqueraram na Praça do Mercado, muito menos estudaram no Colégio Estadual, nem escutaram o flautista do morro; nem fizeram compra no Geo; para quem desconhece que o Cassino foi um hotel que recebeu figuras importantes e, para quem Cônego Higino é só nome de um colégio no Aclimação, para esses, essa cidade antiga não faz o menor sentido.
Isso significa que ela vai, um dia, também acabar. Quando os guardiões dessa memória não estiverem mais aqui para compartilhá-la, quando não houver mais registros dessa época passada, a juventude de hoje não vai manter viva essa cidade. E isso é serio: em trinta anos, no máximo, ninguém mais vai falar ou acreditar que já existiu uma Monlevade nos arredores da Usina. Esse será mesmo o fim do passado.
Por isso, vejo a necessidade de Monlevade dar mais atenção ao seu memorialismo. É necessário um grande projeto, não de resgate, mas de preservação da memória e da cultura local, se um dia quiserem ainda ouvir falar da Cidade Alta, suas ruas, sua praça e suas histórias. É necessário entender que a cidade tem um laço, de aço mesmo, com o seu passado. E, a cada dia, essa memória vai ficando cada vez mais distante, perdida entre palavras, nos causos que não são mais contados, nos ecos do passado. É preciso registrar, catalogar, filmar, gravar. Aproveitar os vivos, antes que sua memória também morra, antes que ela vá, aos poucos, indo embora pelo ralo do esquecimento.
segunda-feira, 21 de junho de 2010
Memória IV – Identidade e cultura
Somos parte do que já foi. O passado é mais poderoso do que o presente, pois ele não apenas nos formou como nada nele pode ser alterado ou destruído. O que chamamos de presente é apenas subúrbio do passado. Com essas afirmações, o escritor irlandês Oliver St.John Gogarty, em seu romance Não é de forma alguma época deste ano, publicado em 1954, faz um relato autobiográfico de sua trajetória pessoal e também do seu país, recontando fatos ocorridos no passado, buscando preencher e entender as lacunas do presente.
Com o fim da cidade alta e o fechamento do Morro do Geo, o monlevadense mergulha nas suas histórias passadas para encontrar de novo a sua identidade perdida, a sua pólis adorada que ficou para trás. Assim, a cidade hoje vive uma crise de identidade. O que caracteriza João Monlevade? O aço, a Usina, tudo bem, todos sabem... Mas o que o monlevadense tem de mais identitário, aquilo que o distingue perante os outros? Mais uma vez afirmo: Para os que nasceram entre os anos 50 e 60, sem dúvida, vai ser a saudade da cidade alta ou a crítica pelo seu fim... Agora, os mais novos, não têm nem mesmo essa referência, muito menos outras...
Identidade, cultura e memória são elementos articulados e que caminham lado a lado. Nesse sentido, o monlevadense tem como marcas de identidade, a sua relação com o que não existe mais na cidade, porque isso faz parte da cultura do município. Lembrar das ruas, do lactário, dos boieiros, do Bar Para Todos, do Grupo de Tábua, do Colégio Estadual, da Rádio Cultura (com música ao vivo), dos bailes e eventos do Grêmio e dos demais clubes, tornou-se um hábito, uma forma de contemplar aquilo que não pode ser mais destruído (embora já tenha acabado).
Mas o pior que poderia ter acontecido com os viventes desta época, sem duvida, foi o muro na entrada do morro do Geo. O fato de não existir mais sequer qualquer oportunidade de contato com o que existia antes, machuca ainda mais. O muro lacra,enterra. É como uma lápide de concreto sobre a cova. Encerrou o passado para sempre. Assim, a recordação é uma arma contra a nostalgia do tempo, para reavivar as marcas do que se foi. A juventude, no entanto, está sozinha e carente dessa identificação com a sua cidade do agora. Tanto que, quem tem menos de vinte e cinco anos, não se lembra (ou se recorda muito pouco) do que era Monlevade antiga.
segunda-feira, 14 de junho de 2010
Memória III - Os Escritores
Orientados pela batuta do ativista cultural, professor Nilton de Souza, o popular Tim Mirim, muitos jovens escritores foram precursores da chamada Literatura Monlevadense. Eles iniciaram um movimento de valorização da produção literária local nas décadas de 70 e 80. Além de produzirem literatura, esse grupo realizava montagens tetrais e se propunha a fomentar a cultura na cidade.
No entanto, um trio formado por Joel da Páscoa, Geraldo Magela e Wir Caetano se propôs a romper com os limites de Monlevade e criou a Revista Rebu, uma espécie de revista panfleto, que tinha laços com a emergente literatura marginal, que tomava conta do cenário brasileiro. Não entendam mal. Marginal aqui tem sentido literal de estar à margem, ou seja, os escritores que não tinham editoras, criavam meios alternativos para publicação de seus trabalhos. Essa geração também ficou conhecida como geração mimeógrafo, a mesma que escrevia e editava seus textos.
A Rebu comemora 30 anos de lançamento em 2010, embora não tenha mais circulação. Ela foi a primeira revista monlevadense a criar laços com escritores de outras cidades mineiras e ainda com outros estados brasileiros. Publicando textos de outros autores, a revista tinha, já naquela época, o espírito que move as redes sociais que hoje fazem sucesso na internet: a elaboração de uma conexão direta com o cenário literário nacional.
Os outros escritores da cidade, por sua vez, reunidos no Grupo de Estudos Literários – Geo também se organizaram para publicar seus livros. Assim, Marcelo Melo, Jaqueline Silvério, João Carlos de Oliveira Guimarães, Tavim Viggiano, Will Jhony, Gehart Michalick, entre outros publicaram seus primeiros trabalhos, com grande repercussão na cidade. Tempos idos...
Tanto a Rebu, quanto o grupo do Geo contribuíram para a efervescência literária e cultural do município. Também, influenciado por essas pessoas, criei junto a um amigo, Marcio Reis, a revista Domínio Publico, em 2000, com o objetivo de divulgar textos e escritos diversos de autores monlevadenses. Inclusive os nossos! A publicação morreu na quarta edição, seguindo uma tendência nacional, de que a maioria das publicações alternativas não sobrevive até o quinto numero. C´est la vie!
terça-feira, 8 de junho de 2010
Memória II
A memória é o essencial, como já disse Jorge Luís Borges. E o monlevadense tem isso como um bandeira. A lembrança dos prédios da cidade alta, da praça, do comercio e de toda aquela vida que havia no entorno da usina, ainda está viva e corre nas veias da cidade, apesar de terem se passado muitos anos.
O memorialismo é tão pulsante, que já ouvi muita gente falando “a minha Monlevade não existe mais”. E isso me incomoda um pouco porque o saudosismo em excesso pode ser prejudicial. Lembrar o passado com tanta avidez é, sim, uma forma de não pensar o futuro. A impressão é a de que o monlevadense ama tanto aquela cidade perdida, que não consegue amar a atual, não consegue fazer o presente progredir. Fica preso ao passado, sem querer buscar o futuro.
Mas entendo. Depois que a cidade alta acabou, criou-se uma lacuna. Um espaço vazio que jamais será preenchido ficou aberto e a memória vem para consolar o fim daquele período. No entanto, é preciso refletir: se aquele bairro não tivesse acabado, estaria de pé até hoje? Será que as faculdades, as rádios, os centros de discussão e fomento ainda seriam na Praça do Mercado? O hipermercado seria construído ali, próximo ao Armazém do Geo? Seria mesmo possível?
Não, certamente, não seria. Mas como os monlevadenses (os que nasceram entre as décadas de 40 e 60) perderam o espaço de sua infância, perderam as referencias de onde estudaram, de onde namoraram de onde trabalharam, surgem as memórias como um amparo de (re) construção de todas essas vidas.
Se a cidade alta continuasse viva, é bem provável que ela estivesse esvaziada, carente de atenção e de investimentos, como hoje está todo o centro industrial. O desenvolvimento não respeita a memória quando faltam políticas de preservação e uma população consciente de seu papel no cuidado com o seu patrimônio.
O que a memória amou fica para sempre. E, por isso, o passado permanece vivo por meio de tantas saudades e lembranças. O fim da cidade alta é uma ferida na alma monlevadense que nunca vai ser fechada. E ela é tão forte, quanto a imagem de um aleijado sentindo dores no braço que já perdeu.
sexta-feira, 28 de maio de 2010
Artigos
Memórias I
Começo a esboçar aqui, uma série de artigos sobre a memória em João Monlevade. São hipóteses, apenas isso. Mas acho interessante destacar a relação do monlevadense com o memorialismo. É algo muito forte e presente no cotidiano da cidade.
Há jornais como o Morro do Geo, do amigo Marcelo Melo que se propõe a resgatar a memória e a história da cidade; há fotografias do passado transformadas em baner’s e expostas no hipermercado; há também muitos artigos de professores e historiadores publicados em revistas e jornais; há o amigo Francisco de Paula (Barcelona) que coleciona fotografias e publicações diversas da cidade, há o também gente boa escritor Francisco Bernardino (Franber, do Real) que conta causos do passado da Usina, há as ações de resgate do Floresta Clube (em nome da memória do que o clube já foi um dia), há o centro de Cultura e Memória da ArcelorMittal, que preserva registros diversos da Usina de Monlevade, além do Circuito Histórico (composto pelo Cemitério, pelo Solar, pelo Centro de Cultura e Memória e pelo Museu do Ferro e Aço), há o acervo do Projeto Resgate da Memória, fomentado pela Acimon e, sobretudo, estão vivas nas pessoas, as histórias do passado recente da cidade.
E é isso que chama a minha atenção: Por que uma cidade de apenas 46 anos de fundação tem um memorialismo tão pulsante na artéria? Claro que não se pode descartar a chegada do francês Jean Antoine Felix Dissandes de Monlevade, há quase duzentos anos. Escrevi um romance histórico sobre a vida de Jean no Brasil, de sua chegada ao Rio de Janeiro em 1817 e sua morte, em 1872, mas não encontrei registros de sua chegada a essas terras. Acredito que tenha sido entre os anos de 1820 e 1822. Em 1827, além do casamento com Clara Sofia de Souza Coutinho, ele aumenta a produção da sua forja catalã com maquinário vindo da Inglaterra. Mas isso é assunto para outros artigos dessa série.
Bem, como o espaço finda, afirmo, seguramente, que o memorialismo do monlevadense é latente por causa da extinção do bairro Cidade Alta, de seus monumentos, suas praças e seus mercados. O fim daquela vida, a extinção de casas onde a maioria das pessoas com mais de 40 anos desta cidade passou a infância, é o gatilho para essa onda do resgate da memória municipal. Em outros artigos, sigo falando desta hipótese. Até.
Do Pessoa
quinta-feira, 27 de maio de 2010
Pergunta que nao cala
O que Monlevade espera de nós?
O que podemos fazer por Monlevade? O que podemos fazer para que a cidade se desenvolva, cresça e prospere? O que fazer para melhorar o trânsito, para fomentar o transporte publico, para resolver o problema do estacionamento no centro da cidade? O que fazer para que Monlevade cresça e apareça?
O que podemos fazer para melhorar a saúde publica? O que fazer para evitar as enchentes na época de chuvas pesadas? O que fazer para evitar desastres maiores do que os que já ocorreram? O que fazer para as pessoas começarem a separar o lixo? E para evitarem o desperdício de água?
O que fazer para atrair mais investidores para o município? O que fazer para melhorar a estrutura da cidade? O que fazer para gerar mais emprego e renda? O que fazer para que o comercio se mantenha firme, competitivo e com ofertas sempre interessantes para o município e consumidores em geral?
O que fazer para que a Cultura se torne um ponto forte? Como fomentar os artistas locais, fortalecendo as atividades e criando oportunidades para o desenvolvimento do setor? Literatura? Teatro? Artes plásticas? E os costumes locais, como podem ser preservados e valorizados? Onde construir um parque de exposições decente, para festas como cavalgadas e aniversário da cidade, como os que já existem em Itabira, em São Domingos do Prata ou São Gonçalo do Rio Abaixo?
O que fazer para valorizar os profissionais da cidade? O que fazer para criar opções de lazer e de entretenimento? O que fazer para que haja mais investimento na formação de jovens? E para a capacitação dos profissionais que estão no mercado há anos mas que não tem tempo de se atualizar? Como oferecer mais saúde?
O que se pode fazer para que a cidade entre na rota do crescimento? O que fazer para que Monlevade se torne referência em algum setor? Como transformar as carências em projetos importantes? Como atrair recursos e verbas para o desenvolvimento? Como promover a integração com outras cidades, trocando experiências, produtos e estreitando os laços?
O que fazer para que as BR381 seja duplicada o quanto antes? O que fazer para que haja mais vontade política de todos os nosso representantes? Como acelerar o progresso? Monlevade está pronta para a duplicação da usina? Ela quer isso mesmo? A comunidade está inteirada para saber exatamente do que se trata? O que Monlevade espera de nós?
Quem souber as respostas que as apresente. Alguém se habilita?
sexta-feira, 23 de abril de 2010
Poema
Agora, há silêncios e passados sobre mim
De tudo, nada restou além do amor
que é também uma espécie de todas as coisas
terça-feira, 20 de abril de 2010
Como se fosse a última vez
Por um instante, parou com a caneta na boca e ficou sorrindo sozinho olhando para a janela à sua frente e enxergando a cena diária da esposa saindo do banho. Não tinha nada de diferente nessa imagem. O que o deixou perplexo e com o coração acelerado pensando nela, foi ter se dado conta de que já havia passado 20 anos ao lado dela e ele nunca percebera no quão intensa era a beleza feminina da esposa ao sair do banho, enrolada numa toalha.
Seus olhos brilhavam e ele sentia as mãos suadas, ao distinguir um a um os cheiros do seu cabelo, da sua pele ainda úmida do banho misturando à textura macia dos cremes. Suas mãos deslizando pelas pernas, alisando a panturrilha e a coxa enquanto camada após camada do macio perfumado hidratante tornava ainda mais viçoso o seu corpo. Em seguida, a mulher secava os cabelos, num gesto contínuo e quase sensual, da maneira que só as mulheres sabem.
Eram quinze para as quatro da tarde e ele ali no escritório a lembrar-se dela. Naquele momento, esqueceu-se dos prazos vencendo e decidiu ir para casa para amá-la e ser feliz. Era preciso fazer isso: abraçá-la e beijá-la como se fosse a última vez. E assim fez. Deixou o escritório sob a luz forte da tarde e caminhou para o carro. Sim. Ia para casa encontrá-la. Pensou em avisá-la, mas preferiu fazer uma surpresa.
Assim que ligou o veículo, colocou para tocar uma canção da qual gostava. Fernanda Porto, numa versão moderna trazia à tona um antigo sucesso de Tom e Vinícius imortalizado por Elis. “Você que é feita de azul, me deixa morar nesse azul, me deixa encontrar minha paz, você que é bonita de mais”, cantava junto, o s versos de “Só tinha de ser com você”. Parou o carro em um sinal de trânsito. Do outro lado da rua, ia uma mulher caminhando com seu cachorro a caminho do parque. Ele achou a imagem bonita. Olhou mais a frente e um casal adolescente tomava sorvete de mãos dadas. Do outro lado, uma menina passava correndo. Ele gostava das cenas que via. Na verdade, estava apaixonado e achava tudo bonito, tudo fantástico, tudo com o ar de sobrenaturalidade. Decidiu parar para comprar um presente para ela. Mais prático, foi a uma floricultura e comprou um buquê enorme de rosas vermelhas. Voltou ao carro e foi a mil para casa.
Ao chegar em casa estacionou o carro e entrou depressa. Antes que a esposa questionasse o por quê dele estar ali àquela hora, beijou-lhe a boca com a vontade dos que se amam e que não se vêem há muito tempo. Surpresa, a mulher não entendeu, mas gostou do carinho ousado naquela autura da vida. Ele não disse nada. Apenas sorriu. Ela sorriu de volta. Então ele disse a ela que em vinte anos, ela nunca estivera tão bonita. Ela sorriu do galanteio. A partir deste momento, não se desgrudaram mais. E os dois, após tanto tempo de casado, se abraçaram e se beijaram e se amaram intenso a tarde toda como dois jovens amantes. A velha chama se reacendera nos seus corações cinqüentenários. E surgira a partir de um instante, a partir de um segundo que trouxe à tona toda a vivacidade de um tempo que passara. E voltaram a namorar, com uma necessidade tamanha um do outro, como se fosse a última vez que o fizessem
segunda-feira, 22 de março de 2010
Continho
Um escritor que morava sozinho na cobertura de um flat, pensou, seriamente, o que aconteceria se ele se atirasse lá do alto e caísse no meio da avenida. Em princípio, achou que seria doloroso. Depois, passou a imaginar que, na verdade, não iria doer nada.
Em que pensaria quando estivesse na queda? Daria para dançar um balé aéreo, antes de se diminuir no solo, achatando-se como massa de pastel na parede? Será que alguém teria dó dele? Ficou assim, por cinco segundos, sentindo a vertigem típica dos que têm medo de altura, mas que têm vontade de chegar da sacada de janelas para ver os carros passando lá em baixo.
Teve a certeza de que iria cair, quando decidiu pisar o ar e sentir a maciez do espaço vazio. Escorregou e ficou com metade do corpo pendurado e a outra, para dentro da sala carpetada do flat. O coração à boca batia forte e as mãos que tentavam segurar a beirada da janela amiga começaram a suar. A tontura aumentou. “Meu Deus, não quero morrer assim”, foi o que pensou naquele momento. Então, com um impulso sobre humano, caiu na sala feito um peixe que vai do aquário ao tapete. Levantou, arrumou o cabelo. Ainda trêmulo, pegou uma dose de uísque.
Eu quero é botar meu bloco na rua
Todos os anos, na época do carnaval, em Monlevade, é a mesma coisa. Muita gente viaja, outras pessoas seguem para as cidades vizinhas, uma parcela fica aqui mesmo, por conta do à toa... E fica no ar uma pergunta que nunca é calada: Por que não há carnaval na terra do francês?
Não sou eu quem vai tentar resolver essa questão. Mas vou dar alguns pitacos. Afinal, acredito que todos podem ganhar com a festa mais popular do Brasil. Inclusive Monlevade. Por que não? Além disso, penso que uma das formas mais interessantes, divertidas e funcionais para fomentar o carnaval é a criação de blocos.
O formato é simples e envolve a participação popular. Cada bairro poderia montar o seu e organizar um ponto de encontro onde o bloco pudesse se concentrar antes do desfile, que poderia ser até um outro ponto estratégico do bairro. Tudo, claro, com a maior segurança, seguindo o lema da diversão sempre responsável.
Em algumas cidades, como São João Del Rei, por exemplo, o carnaval é assim há mais de trinta anos e funciona muito bem. Um dos grupos mais conhecidos no carnaval de Minas, a Batucada, de Diamantina, também é uma variação de um bloco carnavalesco.
Os blocos fazem barulho, animam e garantem a folia. Não há bandas tocando em palcos, não há também tumulto. Cada dia, um ou mais bairros apresentam o seu bloco, cada qual com a sua bateria, suas fantasias e sua animação. Desta forma, todos participam da festa: turistas vindos de longe, moradores, visitantes de cidades vizinhas. Cada bloco tem o seu enredo e a bateria comanda a diversão tocando sambas, marchinhas e sucessos radiofônicos. Não tem erro: é sempre um sucesso.
Esse modelo de festa popular funciona por vários motivos. Vou citar alguns: A prefeitura dá o suporte de infra-estrutura, como decoração, disponibilização de banheiros químicos e o controle do trânsito. Assim, os gastos com o Carnaval são mínimos. Outro ponto positivo, é que ninguém quer ver lixo na porta de sua casa ou briga. Por isso, a festa seria limpa e sem tumultos, já que os blocos iriam sair dos bairros. Ainda um terceiro fator, seria a participação dos donos de bares e restaurantes que poderiam fomentar os blocos, participando da concentração e ajudando na organização.
Fico imaginando um bloco do bairro Republica, concentrando num sábado de carnaval, a partir das 14h, em frente ao Boti Peixadas, por exemplo. Às 18, o bloco desceria a avenida Castelo Branco, com toda a sua animação. Os moradores chegariam às sacadas, brincando com serpentina e confetes. Uma bateria daria o ritmo, até a dispersão, na Praça Onofre Ambrósio.
De toda forma, a idéia dos blocos seria uma opção de carnaval em Monlevade. Com o passar dos anos, a festa se tornaria tradição e a cidade só teria a ganhar. E então, quem compra a idéia?
segunda-feira, 8 de março de 2010
Geraes
terça-feira, 23 de fevereiro de 2010
De volta
sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010
Sabedoria Popular - Trechos de Canções da MPB que são filosofia pura
Drummond!
Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência, essa ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.
Humanos
Carlos Drummond fazia poemas com doses profundas de humanidade.
Vinícius de Moraes amava todas as mulheres, como se amasse toda a humanidade.
Clarice Lispector era a própria humanidade.
E nós, pobres diabos? Onde está a nossa porção de humanidade?
terça-feira, 2 de fevereiro de 2010
Literatura
Este guia acessível mostra o contexto histórico que envolvia cada uma destas grandes publicações, com comentários sobre os enredos e personagens, dados biográficos e outras importantes informações.
Abaixo, veja o sumário completo do livro, que também inclui títulos brasileiros, como "Memórias Póstumas de Brás Cubas", de Machado de Assis, e "Grande Sertão: Veredas", de João Guimarães Rosa.
*
Sumário
1. "Ilíada", de Homero
2. "Odisseia", de Homero
3. "Eneida", de Virgílio
4. "Dom Quixote", de Miguel de Cervantes
5. "Robinson Crusoé", de Daniel Defoe
6. "Tom Jones", de Henry Fielding
7. "Persuasão", de Jane Austen
8. "O Vermelho e o Negro", de Stendhal
9. "O Pai Goriot", de Honoré de Balzac
10. "Jane Eyre", de Charlotte Brontë
11. "O Morro dos Ventos Uivantes", de Emily Brontë
12. "Moby Dick", de Herman Melville
13. "A Casa Soturna", de Charles Dickens
14. "Madame Bovary", de Gustave Flaubert
15. "O Fauno de Mármore", de Nathaniel Hawthorne
16. "Guerra e Paz", de Leon Tolstói
17. "O Idiota", de Fiódor Dostoiévski
18. "O Primo Basílio", de Eça de Queirós
19. "Memórias Póstumas de Brás Cubas", de Machado de Assis
20. "Pan", de Knut Hamsun
21. "Judas, o Obscuro", de Thomas Hardy
22. "Coração das Trevas", de Joseph Conrad
23. "As Asas da Pomba", de Henry James
24. "Howards End", de E. M. Forster
25. "Morte em Veneza", de Thomas Mann
26. "A Época da Inocência", de Edith Wharton
27. "Mulheres Apaixonadas", de D. H. Lawrence
28. "Ulisses", de James Joyce
29. "O Grande Gatsby", de F. Scott Fitzgerald
30. "O Processo", de Franz Kafka
31. "O Sol também Se Levanta", de Ernest Hemingway
32. "Narciso e Goldmund", de Hermann Hesse
33. "Enquanto Agonizo", de William Faulkner
34. "As Ondas", de Virginia Woolf
35. "O Estrangeiro", de Albert Camus
36. "O Apanhador no Campo de Centeio", de J. D. Salinger
37. "Lolita", de Vladimir Nabokov
38. "Grande Sertão: Veredas", de João Guimarães Rosa
39. "On the Road - Pé na Estrada", de Jack Kerouac
40. "O Gattopardo", de Giuseppe Tomasi di Lampedusa
41. "O Tambor", de Günter Grass
42. "Coelho Corre", de John Updike
43. "Cem Anos de Solidão", de Gabriel García Márquez
44. "A Hora da Estrela", de Clarice Lispector
45. "À Espera dos Bárbaros", de J. M. Coetzee
46. "Os Filhos da Meia-noite", de Salman Rushdie
47. "Meridiano de Sangue", de Cormac McCarthy
48. "Amada", de Toni Morrison
49. "O Evangelho Segundo Jesus Cristo", de José Saramago
50. "Submundo", de Don DeLillo
( Informações retiradas do site: http://www1.folha.uol.com.br/folha/livrariadafolha/ult10082u686101.shtml)
quinta-feira, 28 de janeiro de 2010
Sonhos
terça-feira, 26 de janeiro de 2010
Ao som de Blackbird
Mas o que mais o perturbava, não era o que teria pela frente, nem os eventuais problemas com o idioma, com o novo lar ou com a falta de trabalho em um país estrangeiro. Nada disso o incomodava. O que mais o deixava triste e o fazia abandonar o Brasil por uns tempos, era tentar escapar de si, mais precisamente, do desejo de ter conhecido um tio, morto precocemente, antes de ele ter nascido.
Desde criança, sempre ouvira a mãe contar-lhe, com um fio de lágrima no canto do olho a triste história do irmão. O tio, que, aos 19 anos, viajou com os amigos e a família para a praia, a fim de comemorar o novo emprego. Ele iria para a Itália, trabalhar na sede da Fiat. Tudo estava perfeito, mas aconteceu o pior. Ao ver uma menina se afogando, ele não pensou duas vezes em salvá-la. Por ser um bom nadador, conseguiu tirá-la do fundo das águas, mas, já por estar exausto, não resistiu à correnteza e sumiu no mar. O corpo foi achado dois dias depois. Pelo pai, que não descansou até encontrá-lo.
O jovem pianista não sabia o motivo da fascinação pela história do irmão da mãe, que era, sem dúvida, seu herói familiar. No avião, que já taxiava na pista, ele ouvia os quatro de Liverpool entoarem clássicos. A mente ia longe e esbarrava na lembrança do tio. Imaginava-o salvando a menina e não tendo forças para voltar à superfície. O que será que passou na cabeça dele naquele instante, em que era sugado para o mar adentro? Será que ele pensou em algum amor que ficava para trás? Será que ficou com medo, enquanto lutava em vão contra as ondas fortes? Será que chorou em meio do azul e do sal?
Tudo isso girava na cabeça do jovem pianista, que agora ouvia Blackbird. Ele sabia que o tio também gostava desta música. A avó falara, em certo dia de almoço, ao ouvir o neto tocar a canção no piano, que com o primeiro salário, o tio comprara um disco de capa branca e não parava de ouvir aquela melodia lenta e triste. O jovem pianista sentia uma angústia profunda quando a ouvia. Lembrava-se daquele e sentia o desejo de tê-lo conhecido consumir-lhe o coração.
Ele agora viaja para outro país e tem, no peito, a mesma dor de vida que atingia o tio anos atrás. O pianista não sabe, mas o herói-familiar amava cantar, ainda que com um inglês incorreto, a melodia beatle que ouvia ele, agora, dentro do avião. A aeronave começou a ganhar os ares e para trás, Belo Horizonte ia ficando, menos aquela lembrança...
O jovem recorda a avó contando que, após a morte do filho, os discos dele ficaram guardados em uma caixa, no sótão da antiga casa. Ele nunca tivera coragem de ir lá. Sabia que poderia encontrar raridades, mas preferia não tocar nos vinis organizados por ele. Na verdade, agora que voava para longe, ele se questionava o porquê de não ter violado a caixa. Por que não ter escutado os discos?
O pianista nem desconfiava que tinha a mesma vontade de viver intensamente, sem ligar para amarras, como o tio tivera um dia. A vontade de não ter destino certo. Ambos pensavam que a vida é, de fato curta, para ser pequena e que precisa ser aproveitada antes do tempo final, ser ouvida antes do último acorde do baile.
Agora, entre as nuvens, Blackbird já tinha acabado, mas ele resolve repeti-la. Gosta da entonação da voz, gosta do violão inicial e sente-se em apuros com o refrão forte. Mas, ainda assim, para ele, a canção é uma forma de aconchego. Ele olha para as nuvens abaixo do avião e sonha de olhos abertos com os gestos do tio. Imagina que os dois estão em um piano bar, falando da vida que gostariam de ter vivido e das diferenças do tempo de cada um. Ao som de Blackbird, ele vê o céu de dentro e acha que, assim, está mais perto dos olhos e do coração daquele que não mais está aqui.
segunda-feira, 25 de janeiro de 2010
A moça
Amanheceres
Os amanheceres são lindos. Eles têm aquele som típico dos cantares dos galos, ao longe de nossa cama, que nos fazem acreditar que o mundo ainda está escuro. O amanhecer é qualquer coisa de grande impacto, como uma explosão de cores e de luz, chegando devagar e certamente. É quando não há motivos para as tristezas e onde as alegrias reinam absolutas, feito um reino de crianças.
Eu fico pensando que não existe amanhecer mais bonito do mundo. Todos têm a mesma cor, o mesmo cheiro, os mesmos movimentos iniciais de uma rotina que se anuncia.Quando amanhece, dá uma sensação de reencontro com a pessoa amada. É o dia que nasce trazendo alegria e a certeza de, mais uma vez, tudo será diferente. Basta querer. O amanhecer traz isso tudo no ar.
Em janeiro eu vou ter
Dezembrando
Fim de ano é assim mesmo. Todo mundo feliz e esperançoso com tempos melhores e de paz... Todo mundo sai às ruas, naquele pós-chuva de fim de tarde, olha as vitrines e aponta para as decorações mais interessantes. Nem sempre se quer comprar alguma coisa, é verdade, mas pinta aquela vontade de ter grana o suficiente para comprar tudo aquilo o que se vê.
Ah, o fim de ano! Suas cores carregadas de brilho, seus dias longos e noites sufocantes, despertam a magia de que algo bom está por vir no ar. Dá uma sensação de que um ciclo está se fechando e que algo novo e especial está despontando no horizonte. Fim de ano é sempre cheio de expectativas.
As cozinhas ficam mais entusiasmadas. Surgem à mesa, aqueles cadernos de receitas com a capa desbotada pelos pés dos anos e os cheiros de rabanadas, doces em calda de figo, de laranja, de cidra ou mamão saem pelas janelas e compõem uma sinfonia com os demais perfumes típicos dessa época: pernis e perus assando nos fornos, o churrasco no terreiro e os cheiros de limpeza que emana das casas.
Falando nisso, todas as casas no fim de ano mudam um pouco a sua personalidade. Ficam iluminadas de todas as formas e as lâmpadazinhas tomam conta da cidade, revelando os sonhos que se guardam dentro dos moradores. E isso é muito legal. Independente da casa, se solene, ou se despojada, se pequenina ou mansão, se no morro ou no bairro nobre, toda casa brilha no fim de ano.
Fim de ano não é um período, mas quase um estado de espírito. Aliás, essa é uma frase típica de se ouvir no fim de ano... As pessoas ficam mais espiritualizadas, fica todo mundo falando de prosperidade, luz, sorte e mandando energias positivas, repletas de sentimentalidades.
Ma o que fica disso tudo é a sensação constante de que o fim de ano é uma dádiva. Ele é a representação de que é preciso terminar para começar de novo, mostra que a vida continua, mas que é preciso querer mais, sem se esquecer do que se passou. Assim, e só assim, talvez continuaremos aprendendo. Sempre e sempre.
segunda-feira, 18 de janeiro de 2010
quinta-feira, 7 de janeiro de 2010
Continho
A Rainha
quarta-feira, 6 de janeiro de 2010
Dream Time
Em pé: Charles (professor), Vinícius, Mantena, Theo, Maycon Pachola, Erivelton, Fred Godói, Quintino (professor). Agachados: Urso, Giancarlo, Samuel e Betim.
terça-feira, 5 de janeiro de 2010
Poema
À procura de teus olhos
Poço de águas claras
Para o meu conforto.
Ah, seu pudesse, (feito um louvor)
Dar-te-ia um beijo de hortelã
Como o primeiro de cada grande amor
Toda vez que te acordasses de manhã.